Entre encontros e desencontros que a vida oportuniza, cá esbarro a dizer de dias depois saímos do leprosário, mais recente trabalho do pernambucano Thiago Medeiros.
Seguindo o eco de seu livro anterior, lançado no auge da contaminação do COVID-19, e a abordar todo aquele cenário, Thiago segue a dizer e rasurar o que ficou desses/daqueles dias marcado à carne crua no agora, no aqui. Diz-nos tudo isso, como um contador de histórias, que continua a ser, e o diz como alguém que reza, sem qualquer dúvida, sem qualquer certeza. Diz, apenas diz.

Grande parte dos textos se constrói com resquícios de coisas deixadas pelo caminho, o tempo principalmente, mas tudo a nascer naquele instante, inclusive o ancestral. A ancestralidade é um dos grandes alicerces da obra de Thiago, que não a expõe de forma passadista ou folclorizada, mas a traz para esses dias, como parte de um todo que ainda se constrói: as imagens da infância, os gestos e lembranças da bisavó, estão ali se reconstruindo e enocegando o hoje.

Num tom áspero entrançado num telurismo, por vezes visceral na própria carne, diz e redescobre tantas imagens que vão se acumulando uma a uma a dizer metade das coisas, a outra metade fica ao leitor, ambientando veredas profundas do viver, através de vistas que como visagens correm longe de nosso saber.

O poeta se decompõe e descobre ao se despir “então me remendo / remendo / remendo / remendo”, não apenas sobre o seu ser, mas em pardais sob desleixos, em combustíveis guardados a ampulhetas, em amores marcados a alfinetes, além doutros. Entaramela formigas, besouros, domingo, para assim deus. E assim o livro se costura e põe-se em pé a cantar esperança e desesperança, cansaço e atividade, e assim finca a vida no que fica e no que passou, afinal como afirma Octavio Paz “A poesia vive nas camadas mais profundas do ser”, cá estamos, sempre.

por Mailson Furtado,
no sertão desses dias